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‘Eu Posso Ouvir o Oceano’ é o filme mais honesto da Ghibli

Recentemente assisti ao delicioso Eu Posso Ouvir o Oceano, do Studio Ghibli, e ele me deixou com uma mistura estranha de calma, nostalgia e frustração, o tipo de sensação que só histórias de amadurecimento, as famosas coming of age, conseguem criar. Na verdade, esse é facilmente um dos filmes mais incomuns do estúdio, não por causa de algo fantástico, mas por como ele é ordinário. Ele até parece diferente daquela magia habitual da Ghibli, mas existe uma razão para isso. Eu Posso Ouvir o Oceano foi criado pela equipe mais jovem da Ghibli e por estagiários, como um experimento para desenvolver novos talentos. O resultado é um drama calmo e realista, um recorte da vida cotidiana, em vez de uma fantasia ou aventura grandiosa.

Este não é um filme com grandes momentos dramáticos ou arcos emocionais grandiosos. Ele parece mais como olhar um álbum de fotografias antigo: pequenas memórias, interações estranhas e um sentimento intenso, porém confuso, que você só tem por volta dos dezessete anos. E por falar em fotografia, eu amo a arte e a estética desse filme.

Um filme da Ghibli sem a magia da Ghibli (o que o deixa mais interessante)

Tudo nesse filme parece muito “pé no chão”. Talvez por ser um filme experimental, não se arriscaram tanto em fantasia. Não tem nada de criaturas mágicas, nada de jornada do herói, apenas um retrato da vida adolescente na pequena Kochi. As cores e o ritmo tranquilo tornam tudo quase meditativo às vezes, e existe uma coisa reconfortante na simplicidade, mesmo quando os personagens estão longe de serem simples.

Aliás, por falar em personagens, tenho que admitir: Rikako é insuportavelmente irritante. Ela é impulsiva, rude, egoísta e vive colocando os outros em situações desconfortáveis. Mas quanto mais eu penso sobre ela, mais percebo que já conheci pessoas exatamente assim: adolescentes inteligentes e solitários que não sabem lidar com sua própria dor, então essa dor acaba escapando de maneiras tortas.

Isso não é uma crítica à personagem, Rikako não é escrita para ser simpática. Ela é escrita para parecer uma adolescente real, sobrecarregada, com raiva e ainda tentando se entender. E, nesse sentido, ela funciona muito bem.

Taku e Yutaka: a amizade que parece maior que o romance

Outra coisa incrível nesse filme é a amizade entre Taku e Yutaka. O vínculo deles às vezes parece muito mais profundo e genuíno do que qualquer coisa que aconteça entre Taku e Rikako. Existe admiração, ciúme, mágoa e reconciliação, o tipo de complexidade emocional que nem sempre vemos em garotos adolescentes no cinema mainstream.

De certa forma, parece a verdadeira história de amor do filme, mesmo que não seja apresentada dessa forma.

O final: inesperado, incerto e muito humano

O final me pegou de surpresa. Depois de tudo o que aconteceu – e a maior parte foi desagradável – Taku finalmente percebe que gostava da Rikako. No começo isso me confundiu, mas quanto mais pensei, mais fez sentido. Às vezes você só percebe o impacto que alguém teve em você muito tempo depois. Às vezes, as pessoas que mais irritam são as que permanecem na sua mente muito depois de terem ido embora.

Essa não é uma resolução limpa ou satisfatória. Mas a adolescência também não é.

Então por que esse filme ficou comigo?

Eu Posso Ouvir o Oceano me lembra muito dos meus tempos de escola, lá no Ensino Médio. Não dos grandes eventos, até porque não eram muitos, mas dos pequenos momentos que você não sabe explicar por que ainda lembra. Um olhar dentro de um ônibus. Uma conversa no intervalo ou na saída da escola. Um amigo de quem você se afastou. Uma pessoa que te magoou, mas que mesmo assim você ainda se importava com ela.

É uma história imperfeita, discreta e até irritante às vezes. Mas também é honesta de um jeito que poucos filmes de amadurecimento são.

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